quinta-feira, 7 de abril de 2016

Leia o despacho do STJD que suspende Vitória e Juazeirense

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Inicialmente a informação parecia uma mera especulação. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva liberou o despacho que manda suspender a partida entre Vitória e Juazeirense pelo Campeonato Baiano que seria realizado neste domingo em Juazeiro atendendo mandado de garantia junto ao STJD imposto pelo Esporte Clube Bahia.

Leia as alegações do Bahia e o despacho do STJD

Mandado de Garantia Processo nº. 062/2016 – STJD Impetrante: Esporte Clube Bahia Impetrado: Diretor de Registro e Transferência da CBF
DECISÃO 
Cuida-se de mandado de garantia impetrado por Esporte Clube Bahia (Bahia) contra ato perpetrado pelo Diretor de Registro e Transferência da CBF, com pedido de liminar para que seja determinada a suspensão da fase semifinal do Campeonato Baiano de Futebol Profissional da Série A de 2016, até o julgamento final deste caso.

Inicialmente assinala que participa do Campeonato Baiano de Futebol Profissional da Série A de 2016 e já está classificado para a fase semifinal da competição, o que garantiria sua legitimidade. Aduz, ainda, que tomou conhecimento que a equipe do Esporte Clube Flamengo (Flamengo) apresentou Notícia de Infração Disciplinar junto ao TJD/BA, pugnando pelo oferecimento de denúncia em face do Esporte Clube Vitória (Vitória), equipe que o eliminara na fase de quartas-de-final do Campeonato Baiano.

Assevera que, na referida Notícia de Infração, o Flamengo teria afirmado que o Vitória infringiu a norma do art. 214, do CBJD, pois utilizou o atleta Victor Ramos Ferreira de maneira irregular, eis que o mesmo, por ter sido contratado junto a clube do exterior, teve seu contrato especial de trabalho desportivo registrado no BID fora do prazo estabelecido pelo Regulamento da competição.

Acrescenta que o Departamento de Registro e Transferência da CBF, através do Ofício DRT nº. 375/16, “informou que, em que pese o atleta Victor Ramos Ferreira estar vinculado ao clube Rayados de Monterrey, vinculado à federação mexicana de futebol, não foi realizada nenhuma transferência internacional para registrar o jogador no Esporte Clube Vitória, mas sim uma transferência nacional entre a Sociedade Esportiva Palmeiras e o clube baiano.”

Assim sendo, com base em tais informações, tidas como “inverídicas e falsas” por parte do impetrante, a Procuradoria do TJD baiano se manifestou pelo arquivamento da referida Notícia de Infração.

Diante disso, crente na ausência de fidedignidade das informações prestadas pelo Diretor de Registro e Transferência da CBF, o Bahia impetra o presente mandado de garantia, com supedâneo nos seguintes argumentos fáticos:

“A pertinência da medida se agiganta e se mostra ainda mais eloquente quando se observa claramente que o ofício DRT nº 375/16 contraria prévia informação do BID, qual seja, que o contrato do atleta junto a Sociedade Esportiva Palmeiras já estava encerrado desde 31/12/2015, e que a transferência não foi efetuada do clube paulista para o Esporte Clube Vitória, todavia diretamente do Rayados de Monterrey, do México
(...)

E, como o contrato especial de trabalho desportivo firmado entre o Esporte Clube Vitória e o atleta Victor Ramos Ferreira se iniciou em 16/03/16, inegável que entre 01/01/16 e 15/03/16 o jogador estava vinculado ao Rayados de Monterrey, do México
(...)
Portanto, é claro que o atleta Victor Ramos Ferreira não poderia participar do Campeonato Baiano de Futebol Profissional da Série A de 2016, e que o Esporte Clube Vitória violou o artigo 214, do CBJD”. 

Pelas informações do BID, o atleta em questão teria contrato definitivo com o clube mexicano, que o emprestou diretamente para o Vitória, sem qualquer tipo de interveniência ou participação do Palmeiras. 

Sustenta que a transferência se deu sem observância das normas específicas e obrigatórias da FIFA sobre o assunto. 

Dessa forma, entende emergir falsidade na declaração proferida pelo impetrado, a qual acabou por induzir a Procuradoria do TJD/BA em erro, razão pela qual requer o enquadramento da autoridade coatora nos termos dos arts. 234 e 235, do CBJD.

No que se refere ao periculum in mora, deduz evidenciado pela impossibilidade da competição prosseguir sem que a infração praticada pelo Vitória seja apreciada pela Justiça Desportiva, “sob pena de uma eventual penalidade aplicada pela utilização de atleta sem condição legal de atuação não ter qualquer resultado prático, eis que uma próxima fase do denominado ‘Baianão’ 2016 estar prestes a começar com jogos eliminatórios a partir do próximo final de semana (...)”.
Assim, requer a concessão de medida liminar para que seja determinada a suspensão da fase semifinal do Campeonato Baiano de Futebol Profissional da Série A de 2016, até o julgamento final deste caso.

É o relatório. Decido.

A legitimidade do autor evidencia-se, tendo em conta sua participação no Campeonato Estadual da Bahia de 2016, sendo do seu interesse legítimo zelar pelo cumprimento das normas específicas da referida competição.

O objetivo buscado pelo impetrante com este Mandado de Garantia é, em verdade, a formulação de denúncia pela Procuradoria do TJDBA contra o Vitória, em face de possível irregularidade na inscrição e escalação do atleta Victor Ramos em partida do Campeonato Baiano, em desacordo com o Regulamento da Competição, ocasionado por força da discussão da natureza de sua transferência, se nacional ou internacional. Daí que o ato combatido é, a meu ver, o próprio arquivamento da denúncia por parte da Procuradoria do TJDBA, fundamentada nas informações apresentadas pela autoridade impetrada.
O Mandado de Garantia, no entanto, combate ato do Diretor da CBF, consistente na apresentação de informações que, na visão do impetrante, seriam imprecisas ou até mesmo falsas. Ocorre que, ainda que as informações apresentadas pela autoridade impetrada fossem aquelas consideradas adequadas pelo impetrante, isto não importaria necessariamente no oferecimento da denúncia pela Procuradoria local, que poderia manter o arquivamento da notícia de infração por outros fundamentos, já que não há qualquer vinculação entre as informações prestadas pela CBF e a denúncia.

Por tais motivos não me parece precisa a utilização da via do Mandado de Garantia escolhida pelo autor, contra uma mera manifestação, ainda que imprecisa, de Diretor da CBF, justamente porque a correção da informação por si não garantiria o consequente oferecimento de denúncia.

Por outro lado, os fatos narrados são, ainda que num exame superficial, bastante relevantes, e a questão não pode ser menosprezada, pois envolve pontos graves que dizem respeito à boa governança desportiva, não só a nível nacional, como também internacional. Há indícios de burla ou ao menos inobservância de normas expressas e diretas da FIFA – normas de observância obrigatória por parte de seus associados. 
Por tais razões, vislumbro o preenchimento dos requisitos dispostos no art. 119 do CBJD, e, por isso, aplicando o princípio da instrumentalidade das formas e fungibilidade processual, recebo este Mandado de Garantia como Medida Inominada.

De fato, estão presentes aqui o caráter de excepcionalidade, dada a circunstância absolutamente peculiar do caso analisado, além de tratar de tema cuja análise é de palmar importância e verdadeiro interesse para o desporto, especialmente porque presente manifesto risco de descumprimento de normativas internacionais atinentes ao regime de registro e transferência de atletas.

O fundamento utilizado pela Procuradoria para arquivar a denúncia – informação prestada pela CBF – faz recair a competência para análise da Medida Inominada a este STJD, já que, por imposição sistemática, não poderia nunca caber ao Presidente do TJD local avaliar a conformidade de conteúdo de informações prestadas pela Diretoria da entidade nacional.

Recepcionada como medida inominada, verifica-se que a mesma é, outrossim, tempestiva. Foi oferecida em 04.04.16, e o ato efetivamente atacado é de 03.04.16 (a saber, a decisão da Procuradoria do TJD/BA que determinou o arquivamento da notícia de infração apresentada pelo Esporte Clube Flamengo, da Bahia).

Feitas estas considerações, passo a análise do pedido liminar. 
O regulamento da competição prevê que só poderão ser inscritos para participar da Campeonato os atletas que tiverem seu nome publicado até as 19hrs do dia 16.03.2016 no BID da CBF (§3o do art. 20 do Regulamento). É certo que o atleta Victor Ramos teve seu registro publicado no BID apenas em 18.03.2016.

Para aferir a possibilidade de sua inscrição, restaria saber se a transferência do atleta foi uma transferência nacional ou internacional. Para tanto, devem ser analisados o seu histórico contratual, bem como os registros na CBF.

Nesta toada, verifica-se pelos documentos acostados pelo autor, que o atleta Victor Ramos possui contrato definitivo com o clube Monterrey do México, tendo sido contratado por empréstimo pelo Vitória até 31.12.2016. Ou seja, o atleta foi contratado por empréstimo de um clube do México.

Neste caso, parece ter pouca importância que o atleta tenha sido emprestado ao Palmeiras, porque dito empréstimo terminou em 31.12.2015, e o seu vínculo com o Vitória começou apenas em março de 2016. Ou seja, após o término do vínculo, o atleta teve reativado seu vínculo com o Monterrey, tanto é que consta do BID que o mesmo veio ao Vitória diretamente por empréstimo do clube mexicano. Não há, aparentemente, relação entre Vitória e Palmeiras.

Ao menos neste juízo superficial, que é exatamente o mesmo juízo que deve orientar a Procuradoria em sua decisão de oferecer ou não a denúncia, me parecem que há indícios suficientes, para não dizer evidências suficientes, de que se trata de uma transferência internacional. 

Digo isso baseado ainda em dois precedentes de situações análogas, que tiveram procedimento diverso de registro no BID da própria CBF. Refiro-me aos casos dos atletas Walter Henrique da Silva e Kelvin Mateus de Oliveira. Verifica-se pelos registros do BID que o primeiro teve contrato definitivo com o Atlético Paranaense encerrado em 31.12.2015, foi transferido para o Porto de Portugal em 01.01.2016, com contrato definitivo até 30.06.2019, e foi emprestado ao próprio Atlético a partir de 07.01.2016 até 31.12.2016. Ou seja, mesmo quando o atleta permanece no próprio clube, há registro da transferência internacional, com uso do sistema TMS da FIFA. O segundo atleta tem contrato definitivo com o mesmo Porto até 30.06.2018, esteve emprestado ao Palmeiras até 31.12.2015, sendo transferido de novo por empréstimo ao São Paulo a partir de 01.02.2016 até 31.12.2016. Também neste caso o atleta teve seu contrato reativado com o Porto, tudo via sistema TMS, sendo claro que houve uma transferência internacional. No exposto acima, a meu ver, verifica-se presente o requisito do fumus boni iuris.

Quanto ao periculum in mora, o mesmo encontra-se manifesto na situação fática abaixo delineada.

O sistema de denúncia a partir de notícia de infração previsto no CBJD (art. 74 do CBJD) dispõe, em seu parágrafo §2o, que, em caso de manifestação do Procurador pelo arquivamento, o interessado pode solicitar ao Procurador Geral que se manifeste, cabendo a este a palavra final sobre o caso.

Percebe-se, por tudo que foi exposto, que há, pelo menos neste juízo preliminar e superficial, elementos suficientes para eventual oferecimento de denúncia pelo Procurador Geral, a quem caberá manifestar-se. Dentro desse quadro, haverá, pelo menos em tese, risco de penalidade a ser imposta ao clube Vitória, sendo prudente evitar a realização de partidas que porventura possam vir a ser anuladas. Nada pode contribuir mais para o descrédito do esporte do que a anulação de partidas que tiveram a presença de torcedores que pensavam estar a assistir uma partida válida.

Sabe-se que Justiça Desportiva deve, ao máximo possível, prestigiar o resultado de campo, ciente de seu papel de coadjuvante da atividade esportiva. As experiências de modificação de resultado de campeonato após o encerramento de competições em virtude de decisão da Justiça Desportiva, são sempre traumáticas e contribuem de forma negativa para a imagem do esporte. Assim, a cautela recomenda evitar o risco de produzir-se novos resultados que possam, em tese, vir a ser anulados no futuro.

Sendo assim, defiro em parte o pedido de suspensão da fase semifinal do Campeonato Baiano de 2016, para suspender somente as partidas do dia 10.04.2016 e do dia 21.04.2016 entre Juazeirense e Vitória, mantendo-se, no entanto, a realização das partidas entre Bahia e Fluminense de Feira de Santana previstas para o dia 09.04.2016 e 20.04.2016. Referida suspensão deve perdurar até julgamento pelo TJD/BA sobre eventual denúncia oferecida pelo Procurador Geral do TJD/BA, cabendo ao TJD decidir se mantém ou não a suspensão das partidas.

Note-se que aqui não se está proferindo juízo de valor sobre o mérito de eventual denúncia, não se trata aqui de julgar se houve ou não infração cometida pelo Clube. Apenas pretende-se, por precaução e prudência, evitar a realização de partidas que podem, em tese, vir a resultar inócuas, diante das circunstâncias fáticas específicas do caso.

Intime-se, com urgência, à Federação Baiana de Futebol, para providenciar o cumprimento da decisão e para integrar a presente lide. Intimese, também para integrar a lide, o Vitória Esporte Clube e o Diretor de Registro e Transferência da CBF, Dr. Reynaldo Buzzoni.

Dê-se ciência ao Autor, bem como ao Fluminense de Feira de Santana.

Rio de Janeiro, 07.04.2016.
CAIO CESAR ROCHA Presidente do Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol

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